Dança-Educação/Dança e Educação?
“A necessidade de transformação social continua sendo uma premência em nossos dias. O papel do ensino da dança no Brasil não pode passar ingenuamente ao largo de reflexões, discussões, propostas e apelos. Não pode ser o ensaio da valsa sobre o cadafalso.” Isabel Marques
Diante dessa reflexão, Marques (2009) levanta reflexões acerca das palavras dança e educação, por ambas remeterem a dois campos semânticos, gerados de no mínimo duas áreas de conhecimento e de dois polos de atuação profissional.
A dança e a educação entendidas como um binômio - seja ele construído por uma conjunção, uma barra, um hífen ou por uma aglutinação - delimitam um campo híbrido. No sentido híbrido, dança e educação estão ligados, mas sem a necessidade de se misturarem ou se fundirem. Ao contrário, quando entendidas enquanto área de conhecimento e atuação profissional, se fundem dialogicamente em justaposição.
Devemos refletir sobre os pontos de confluências entre dança e educação, lembrando que educar não se resume a ensinar, portanto a educação não se restringe ao professor. A sociedade como um todo educa, e artistas também educam, mesmo não estando em “sala de aula” dando aula, pois criam trabalhos de arte que são compartilhados com o público, assim como arquitetos educam por meio de seus projetos de construção; pais e mães educam com suas posturas e atitudes.
Segundo Marques (2009), quando tratamos do binômio dança e educação, não restringimos ambos ao universo da docência (professor/escola), mas tratamos da relação de todos os profissionais de dança envolvidos no cenário social.
Portanto, o conhecimento para Paulo Freire (1982) é interlocutor entre o sujeito e o mundo em que vivemos, e há duas maneiras básicas dos indivíduos estarem/serem no mundo: por meio dos contatos e/ou das relações.
- Contatos: são reflexos unívocos, inconsequentes, intranscendentes, estáticos, monológicos e intemporais.
- Relações: são reflexivas, plurais, consequentes, transcendentes, dialógicas, transformadoras e temporais.
Dessa maneira, a nossa reflexão caminha para uma relação entre dança e educação, ao invés de meros contatos.
- Para Brecht (188-1956), em seu poema “Desordem Sangrenta”, considera a passividade diante do caos uma aberração quase ontológica.
- Freire (1982, 1983, 1996) enfatiza que a educação tem eminentemente função social e política; para o autor, a educação é um ato político.
- Marques (2004, 2007) afirma que a dança enquanto arte do/com/pelo corpo, quer seja em situação educacional, educativa ou pedagógica, carrega em si mesma o potencial de transformar os cenários cotidianos educacionais. No entanto, o modo como ela é ensinada pode fazer com que esse potencial da arte da dança seja ou não transformador.
Os três autores fazem um apelo à não passividade, à contundência, em relação ao ensino de dança, e nesse trajeto a arte em si, quando trabalhada de forma problematizadora, articulada e crítica, possui esse potencial transformador na educação por relações, se não por contatos que dificilmente transformam.
“O homem está no mundo e com o mundo... isto o torna um ser capaz de relacionar-se... vai criando, recriando, decidindo...” Paulo Freire
Dança-Contatos-Educação
Professores de dança que confiam somente no feeling para propor dança aos seus alunos; programas de governo que alegam falta de verba para continuidade de projetos de dança; artistas que vão para as escolas, para aulas “máster”, sem conhecer os propósitos de programa de ensino e nunca mais aparecem; gestores que não contratam especialistas - professores licenciados ou especializados - para ministrar aulas de dança nas escolas; aulas técnicas codificadas (balé, jazz, moderno, flamenco etc.) que visam ao aprimoramento corporal dentro da técnica estabelecida; gestores, diretores de escola e professores que se contentam com “dancinhas” pontuais nas festas comemorativas e não questionam os processos porque passaram os alunos; aulas de dança que são um conjunto de atividades; dentre outras inúmeras possibilidades que podemos ressaltar como exemplo, proporcionam contatos dos alunos com a dança por meio da educação.
Dança-Relações-Educação
Paulo Freire (1982), ao afirmar que contatos são reflexos - e não reflexivos -, enfatiza os aspectos instintivos, passivos e ingênuos dos contatos. As relações são reflexivas: conscientes e críticas, fruto de discernimento, de escolhas, pois somente na atitude crítica há potencial para a transformação.
Em uma aula de dança é necessário muito mais que um feeling, é necessário conhecimento; uma aula requer mais que atividades legais, requer um fio condutor com propósitos claros, amplos e profundos. Nesse caso, o professor pensa, articula, propõe, não intui, ele fundamenta e organiza sensações, feelings e sentimentos. Proporcionando estabelecer relações entre dança e a educação.
Entretanto, não podemos desconsiderar no campo da dança – da arte, do corpo – a presença do feeling, da intuição, do instinto na concepção do conhecimento, pois estes são focos essenciais em uma aula de dança, podendo se entrelaçar e tecer relações necessárias a um ensino de dança crítico e transformador, mas não podem ser o fim e a única ferramenta do trabalho do professor de dança, afirma Marques (2010).
Dança como forma de conhecimento
A escola pode dar parâmetros para a sistematização e a apropriação crítica, consciente e transformadora dos conteúdos específicos da dança, não tendo o papel apenas de reproduzir, mas sim de instrumentalizar e construir conhecimento por meio da dança.
Marques (2003) aponta que a construção de conhecimento no campo das artes implica três tipos de saber diferenciados e, ao mesmo tempo, complementares: o conhecimento direto, sem intermediação das palavras; o conhecimento sobre as artes; o conhecimento de como fazer algo. Traduzindo esses sentimentos para a área da dança, estes equivaleriam a experimentar, sentir, fazer dança.
- direto = experimentar
- sobre = sentir
- como = fazer
Contudo, Reid (1983) enfatiza que as artes são somente alimentadas pelo conhecimento direto, ou seja, somente podemos dizer que realmente conhecemos e sabemos algo sobre/de uma dança quando formos capazes de senti-la e percebê-la em nossos corpos. Em seus trabalhos (1981, 1986), esse mesmo autor distingue a arte em dois tipos de sentimentos: o sentimento afetivo, associado às vivências/descargas emocionais; o sentimento cognitivo, com o qual a dança, enquanto forma de conhecimento e disciplina escolar, estaria mais engajada.
Muito mais que do que “auto-expressar-se”, “desanuviar tensões”, “sentir o íntimo da alma”, tal qual defendem muitos dançarinos (as) e professores (as) de dança que associam às emoções, o conhecimento direto da dança (a vivência prática) permite um tipo diferenciado de percepção, discriminação e crítica tanto da dança quanto de suas relações conosco mesmo e com o mundo .(MARQUES, 1989 apud 2003, p. 23)
Conteúdos Específicos da área da dança
Segundo Marques (2003), a especificidade da dança está em ser tratada como arte e não somente como movimento. A dança é, na verdade, uma articulação entre movimento, dançarino(a), som, espaço geral onde ocorre, articulação esta que dá coloridos diferenciados aos repertórios/improvisação de dança.
Preston-Dunlop (1992), baseando-se na Técnica de Laban, denominou de sub-textos da dança os aspectos coreológicos, o movimento e suas estruturas. É o trabalho com essas estruturas da dança que fazem com que possamos perceber, experimentar e entender em nossos corpos o que, onde, como e com quem/o quê o movimento acontece. Incluir a teoria à prática com as diversas partes do corpo, com suas dinâmicas de movimento, com o uso do espaço pessoal de cada um, das ações e dos relacionamentos que se estabelecem, possibilita uma relação com ela.
Para tanto, se faz necessário também o conhecimento das nossas habilidades/possibilidades corporais cárdio-vasculares, respiratórias, a coordenação muscular e a dinâmica do equilíbrio postural. Tudo isso mais a coreologia propõem a consciência corporal e o conhecimento de como dançar.
Para Marques (2003), um segundo grupo de conteúdos da dança foi denominado pela autora de contextos da dança, em que inclui elementos históricos, culturais e sociais da dança como história, estética, apreciação e crítica, sociologia, antropologia, música, como também noção de anatomia, fisiologia e cinesiologia, compondo assim os saberes sobrea dança.
Um terceiro grupo chamado de textos, que possibilita um conhecimento direto da dança nas artes, são essencialmente os repertórios dançados. Em se tratando de um contexto educacional, essa noção pode se expandir para todas as preposições que trabalham com o aluno este mundo da dança ou seus processos: a improvisação, a composição coreográfica, o próprio repertório, possibilitando uma prática e compreensão da dança em si.
Qual “dança” devemos ensinar?
Atualmente, existem diferentes modalidades de dança em nossa sociedade, temos desde a dança voltada ao lazer, como as coreografias de carnaval, algumas danças de salão, as danças das casas noturnas, aos rituais (terreiros de candomblé, por exemplo) e as danças ditas teatrais (ballet clássico, dança folclórica, moderna, contemporânea, entre outras).
Nossa sociedade é dominada por redes de comunicação de maneiras múltiplas e complexas que afetam de maneira objetiva nossos conceitos de tempo e de espaço e, consequentemente, de dança e de educação.
Experimentamos hoje uma dança substancial, instantânea, que nos permeia uma vivência sem limite, sem fronteira. Tudo está mais maleável. Contudo, nossas emoções, intuições, crenças espirituais, não se resumem à concretude do mundo.
Marques (2003), dentro das propostas supracitadas, propõe para o ensino da dança nas escolas uma maneira múltipla e sistêmica de conectar conhecimento, as pessoas e suas realidades sociais, políticas e culturais, o que Fritjof Capra (1982) chamou de “eco-ação”.
Nessa perspectiva, a seleção dos conteúdos para uma aula de dança, assim como a elaboração de seu planejamento, se dá pela articulação múltipla entre o contexto vivido, percebido e imaginado pelo/do aluno e os subtextos, textos e contextos da própria dança. Enfim, uma criação ancorada em uma “rede de textos” tecida especialmente para cada situação educativa.
Exemplo: Aula de improvisação em dança, com dinâmicas de movimento para crianças de 07 a 12 anos, que abordasse a violência como premissa de pesquisa para o desenvolvimento dessa aula.
- Faixa etária: 07 a 12 anos
- Contexto: violência (alunos que moram na periferia de suas cidades)
- Texto: aulas de improvisação
- Subtexto coreológico: dinâmicas de movimento
Propor algo que seja compatível com as maneiras de nossos alunos de pensar, agir e viver o tempo, o espaço, o corpo, a dança no mundo contemporâneo. Que o ensino da dança seja significativo tanto para os alunos quanto para o mundo em que vivemos.
Por Que Dança na Escola?
A Dança na escola contempla uma nova proposta de ensino que abrange fundamentos da Dança-Educação e da Dança Educativa Moderna. Diferentemente das tradicionais e já conhecidas técnicas, a Dança aplicada ao conteúdo escolar não pretende formar bailarinos; antes disso, consiste em proporcionar ao aluno um contato mais efetivo e intimista com a possibilidade de se expressar criativamente através do movimento. Essa proposta se resume na busca de uma prática pedagógica mais coerente com a realidade escolar, onde a Dança preparará o corpo dos alunos a fim de que se exercitem de acordo com suas necessidades, desenvolvendo a destreza, a agilidade e a autonomia, estimulando os movimentos espontâneos e a precisão do gesto, sendo indispensável para isso agir para que os alunos compreendam o que fazem e por que o fazem, pois o movimento expressivo é, antes de tudo, um movimento consciente. Nesse sentido, a Dança se liberta de um academicismo que a torna inacessível à maioria das pessoas, mostrando que não se resume apenas ao aprendizado de técnicas e estilos (tais como ballet, jazz, etc.), pois que abrange um contexto mais elevado do que simples classificações como estas. Isto porque o ser humano dança por uma necessidade interior, muito mais próxima do campo subjetivo que do físico, e porque seus movimentos constituem formas de expressar os seus sentimentos: desejos, alegrias, pesares, gratidões.
A Dança na escola não é a arte do espetáculo, é educação através da arte; por isso mesmo se traduz em alguns preceitos que seguramente são essenciais para o seu desenvolvimento:
- a (re)descoberta do movimento como expressão criativa e participativa nos importantes momentos da vida (construção da auto-estima, da consciência e harmonia corporais), vivendo o corpo de uma maneira mais satisfatória e gostando de se expressar através dele;
- a defesa em favor da Dança - e da Arte -, já a partir da infância, como um despertar para a responsabilidade dos seres em relação ao próprio corpo, à procura de um melhor modo de viver;
- a capacitação técnica do amador de dança, sabendo diferenciar sua intenção de amador e não de profissional;
- o dançar brincando, com liberdade e prazer, sem o aprisionamento em códigos formais, mas através da prática de um ensino diferenciado: um aprendizado com fundamentação técnica mais criativa dos conteúdos de uma aula de dança.
É fundamental que a Dança na escola se realize através de um professor que não seja o impositor de técnicas e conceitos, mas o fomentador das experiências, o guia que orienta os alunos para uma descoberta pessoal de suas habilidades. Através da Dança, então, o aluno poderá recobrar a confiança no ser humano que é; pleno e capaz, devolver-se-lhe-á a capacidade de se movimentar criativamente, pois é a Dança uma das expressões que suscita o sentido de ser. Sentido de ser este que implica não só na compreensão psicológica da vivência corporal, mas, também, numa experiência física que se torna ponto de referência para o qual se pode retornar espontaneamente, a qualquer momento que se deseje fazê-lo. Isto permitirá que o aluno se torne, mas receptivo às solicitações exteriores. Seja para acolhê-las ou para delas se defender, tanto melhor será sua resposta.
Nesse contexto, a Dança trata do resgate da própria personalidade, do contato com o lado mais humano através da expressão artística: o indivíduo se expressa e se torna capaz através da Arte que produz e que lhe devolve toda a sua potencialidade de viver e de se realizar plenamente. “Uma nova concepção da educação do movimento deve passar primeiramente por estas exigências, porque é no decorrer da infância e da juventude que se formam hábitos decisivos para a vida.(...) A educação corporal não é tão importante quanto a da mente?” (...) “O cérebro se empanturra, enquanto o corpo permanece esfomeado. Quando o intelecto se torna o único ponto de referência e valorização, estabelece-se uma ruptura profunda(...), perde-se toda a capacidade de espontaneidade” (BÈRGE, 1988).
Marina Gonçalves Barbieri Ferrari, Bacharel em Dança e Mestre em Artes, afirma que a educação básica necessariamente passa pela prática das Artes; especificamente a Dança busca proporcionar ao aluno o desenvolvimento de uma visão mais crítica do mundo, que não se resume apenas ao campo do intelecto; ao contrário, envolve o ser humano de uma maneira integralizada, tal como foi concebido, contribuindo de maneira decisiva para a formação de cidadãos mais críticos e participativos da sociedade em que vivem. E nisso se resume a busca de todos nós: o bem-viver.
O corpo no espaço escolar
O indivíduo age no mundo através de seu corpo, mais especificamente através do movimento. É o movimento corporal que possibilita às pessoas se comunicarem, trabalharem, aprenderem, sentirem o mundo e serem sentidos. No entanto, há um preconceito contra o movimento. Solange Arruda, na introdução de seu livro Arte do movimento, afirma que “é mais chic, educado, correto, civilizado e intelectual permanecer rígido. Os adultos, em sua maioria, não se movimentam e reprimem a soltura das crianças.” Isso começa em casa e se prolonga na escola.
Embora conscientes de que o corpo é o veículo através do qual o indivíduo se expressa, o movimento corporal humano acaba ficando dentro da escola, restrito a momentos precisos como as aulas de educação física e o horário do recreio. Nas demais atividades em sala, a criança deve permanecer sentada em sua cadeira, em silêncio, e olhando para frente. Ciro Giordano Bruni afirmava a esse respeito que virou quase regra estabelecer entre a arte e a ciência uma lastimável distinção: a primeira se aprende como uma atividade lúdica e a segunda, de uma maneira séria e constrangedora. Sua crítica não se fixa apenas na questão da ausência do lúdico nas disciplinas científicas da escola, mas também na ausência de seriedade nas disciplinas artísticas, comportamento que tende a acentuar a visão de que o ensino de arte é supérfluo.
A noção de disciplina na escola sempre foi entendida como “não movimento”. As crianças educadas e comportadas eram aquelas que simplesmente não se moviam.
O modelo escolar-militar da primeira metade do século XX era aplicado desde o momento em que a criança chegava à escola. As filas por ordem de tamanho para se dirigirem às salas de aula, o levantar-se cada vez que o diretor ou supervisor de ensino entrava na sala etc. Atualmente, são raros os estabelecimentos escolares que mantêm esse tipo de atitude, encontrado ainda apenas em escolas de cunho religioso e em algumas escolas públicas de cidades pequenas do interior do estado. Nas escolas da rede pública das grandes cidades, essa realidade já não existe. Apesar da ausência dessas atitudes disciplinares, a ideia do não movimento como conceito de bom comportamento prevalece. Muitas escolas aboliram as filas e os demais símbolos de respeito a diretores e professores, no entanto, foram criadas outras maneiras de se limitar o corpo.
O movimento corporal sempre funcionou como uma moeda de troca. Se observarmos brevemente as atitudes disciplinares que continuam sendo utilizadas hoje em dia nas escolas, percebemos que não nos diferenciamos muito das famosas “palmatórias” da época de nossos avós. Professores e diretores lançam mão da imobilidade física como punição e da liberdade de se movimentar como prêmio. Constantemente, os alunos indisciplinados (lembrando que muitas vezes o que define uma criança indisciplinada é exatamente o seu excesso de movimento) são impedidos de realizar atividades no pátio, seja mediante a proibição de usufruir do horário do recreio, seja por meio do impedimento de participar da aula de educação física, enquanto que aquele que se comporta pode ir ao pátio mais cedo para brincar. Essas atitudes evidenciam que o movimento é sinônimo de prazer e a imobilidade, de desconforto.
Os cursos de Educação Artística, cujo caráter “menos formal” poderia possibilitar uma maior mobilidade das crianças em sala de aula, tendem a priorizar os trabalhos em artes plásticas (desenho, pintura e algumas vezes escultura), atividades nas quais o aluno acaba tendo de permanecer sentado. Embora a LDB 9394/96 garanta o ensino de Arte como componente curricular obrigatório da Educação Básica representado por várias linguagens – música, dança, teatro e artes visuais –, raramente a dança, a expressão corporal, a mímica, a música e o teatro são abordados, seja pela falta de especialistas da área nas escolas, seja pelo despreparo do professor.
Apesar de essas atitudes estarem muito presentes, algumas experiências (que caminham exatamente no sentido oposto) têm nos mostrado o quanto o movimento pode contribuir para se criar no espaço escolar outro ambiente. A introdução de atividades corporais artísticas na escola, ou seja, a realização de trabalhos de dança-educativa ou dança-expressiva, como são comumente chamadas (embora não goste muito desses nomes, afinal, toda dança é educativa e expressiva), tem mudado significativamente as atitudes de crianças e professores na escola. A dança no espaço escolar busca o desenvolvimento não apenas das capacidades motoras das crianças e adolescentes, como de suas capacidades imaginativas e criativas. As atividades de dança se diferenciam daquelas normalmente propostas pela educação física, pois não caracterizam o corpo da criança como um apanhado de alavancas e articulações do tecnicismo esportivo, nem apresentam um caráter competitivo, comumente presente nos jogos desportivos. Ao contrário, o corpo expressa suas emoções e estas podem ser compartilhadas com outras crianças que participam de uma coreografia de grupo.
A dança e seus diferentes fins
Quando se fala em dança na escola, milhares de imagens começam a povoar nossas mentes. Afinal, de que dança estamos falando? Ao chegarmos às instituições, costumamos interrogar as crianças e os adolescentes sobre sua compreensão de dança. É interessante observar que se há alguns anos atrás a primeira imagem que vinha à mente desses jovens era a figura da bailarina clássica nas pontas dos pés, hoje, essa imagem (embora ainda presente) já está sendo substituída por outras trazidas pela mídia. As respostas variam entre as dançarinas do “Tchan” e algumas pop stars norte-americanas (nota-se a predominância da figura feminina). Quando interrogados, então, sobre o que querem aprender em uma aula de dança, as respostas se multiplicam, indo do ballet clássico às danças de rua.
No próprio curso de Licenciatura em Dança da Unicamp também encontramos diferentes expectativas por parte dos alunos. Uns têm interesse direto em trabalhar a dança nas escolas da rede de ensino, logo, a dança dita “educativa”. Outros, em trabalhar em escolas especializadas como conservatórios e academias, com técnicas de dança específicas para a formação do profissional. Há ainda os que preferem trabalhar o aspecto social da dança, ou seja, a dança como atividade de reinserção social em programas de apoio a pessoas desfavorecidas. Todas essas expectativas não podem ser ignoradas. Elas revelam a própria abrangência da área de dança e temos, assim, de aprender a lidar com elas, sem perder de vista o objetivo das licenciaturas, ou seja, habilitar o futuro profissional para trabalhar no Ensino Fundamental e Médio.
Jacqueline Robinson, bailarina e educadora francesa, elaborou um diagrama no qual indica de forma clara a gênese e as diferentes aplicações da dança no mundo contemporâneo.

Toda dança, não importa à qual estética é inerente, surge da profundeza do ser humano ou, como Robinson nomeou, surge da “magia” e adquire diversas funções a partir de três motivações principais: a expressão, o espetáculo e a recreação (ou jogo).
A expressão é a motivação mais significativa da dança, sendo representada na árvore de Robinson como o tronco principal. É nesse tronco que se situam o teatro, a dança contemporânea, a educação e o lazer. Ao redor desse tronco principal, com uma bifurcação para a recreação e outra para o espetáculo, estão as danças populares. Robinson fez essa divisão, uma vez que essas manifestações podem ser a expressão de uma comunidade, como rito ou jogo, e ainda serem exploradas por meio de espetáculos. Há ainda as manifestações populares consideradas “puras”, ou seja, que não perderam seu caráter original de rito, que Robinson localizou em um tronco à parte, entre a recreação e a expressão, chamando-o de “danças primitivas”, na falta de uma melhor expressão para intitulá-las.
No tronco recreação, encontramos as danças amadoras, as danças de salão, a ginástica rítmica e o jazz, todas as técnicas praticadas por indivíduos sem interesse profissional. Percebe-se que o jazz teve sua origem na recreação, profissionalizando-se posteriormente, ao encontrar seu caráter espetacular. O inverso aconteceu com a dança clássica. De origem estritamente espetacular e profissional, com o decorrer dos anos, ganhou adeptos amadores que buscam essa rígida técnica como complemento da educação corporal formal.
Em uma tentativa de atualizar essa árvore, poderíamos acrescentar muitas outras danças: algumas danças populares brasileiras, como o forró, o samba, a lambada e recentemente o axé, que também conquistaram os espaços dos cursos de dança de salão ao lado dos imortais valsa, tango e bolero. As danças provenientes de regiões e países específicos, como a dança do ventre, a dança flamenca, o sapateado americano e irlandês (tão em voga atualmente) e as danças de rua (ou street dance), poderiam ser introduzidas como um galho que se inicia nas expressões culturais (folclóricas) e se ramifica tanto para o campo profissional do espetáculo quanto para a área de recreação (amadora). Um bom exemplo são as danças de rua. Elas tiveram origem nos guetos negros norte-americanos, como forma de protesto, e ganharam adeptos no mundo todo. Como o rap, o funk e o break, muitas dessas danças já saíram das ruas e invadiram as academias e palcos teatrais.
Nesse diagrama, fica evidente a diferenciação que é feita entre o fazer amador, o profissional, o educativo e as manifestações culturais. Mas seria o ensino de dança um só para todos? No curso de Licenciatura em Dança, deixamos em aberto a opção estética. O que importa não é a linha escolhida, mas como por meio dela podem-se trabalhar os elementos que consideramos importantes para o desenvolvimento integral do indivíduo na escola.
Em instituições nas quais a dança começou a ser trabalhada, professores e diretores sentiram a diferença de comportamento de seus alunos, a começar pelo número de faltas, que diminuiu razoavelmente. A participação dos alunos em outras atividades promovidas pela escola (festas, semanas culturais e científicas, gincanas etc.) começou a ser mais efetiva. De maneira geral, os professores são unânimes ao afirmarem que o interesse do aluno pelo ensino melhorou, como se por meio das atividades de dança na escola o aluno tivesse reencontrado o prazer de estar nessa instituição.
No entanto tudo isso não se deu sem problemas. A experiência com os alunos estagiários da Licenciatura em Dança da Unicamp tem mostrado que se a dança está aos poucos conquistando um espaço diferenciado dentro da formação escolar fundamental, muitas barreiras ainda têm que ser derrubadas. A primeira delas é a receptividade dos próprios professores da escola. Alguns tendem a “menosprezar” o trabalho, considerando a dança um “luxo” de menor importância no conjunto das disciplinas oferecidas pelo currículo. Esses professores acabam assumindo posturas que dificultam o trabalho dos estagiários, como, por exemplo, intitularem o trabalho “aula de recreação”. Ao ouvirem essa nomenclatura, os alunos saem correndo dispersos para o pátio e ninguém consegue mais reagrupá-los para a aula. Alguns professores que aprovam a iniciativa, por outro lado, reclamam que as crianças ficam mais agitadas nos dias em que há atividades de dança. Assim, para “acalmar” a classe, acabam usando a famosa “chantagem”: ou vocês ficam quietos e prestam atenção, ou não irão para a aula de dança. A segunda barreira diz respeito a outro tipo de preconceito, dessa vez não do professor, mas do próprio aluno. Em algumas escolas, os estagiários são obrigados a chamarem o trabalho de “expressão corporal”, pois se o nome “dança” aparece, muitos meninos se recusam a participar da atividade por não serem “mulherzinhas”.
No trabalho com adolescentes, a realidade é outra. Quando interrogados sobre o que é a dança ou sobre qual dança gostariam de aprender na escola, a maior parte dos jovens (sobretudo os rapazes) opta pelas danças de rua (rap, funk, break). Apesar de essas danças possuírem uma movimentação considerada agressiva pelos adultos, elas fazem parte do universo desses jovens. A violência é um dos temas mais explorados. Eles simulam lutas, fazem gestos obscenos, criam na execução da coreografia grupos que se enfrentam etc. No entanto é interessante notar que tudo isso é a “ritualização” da violência, não a violência em si. Há exemplos de grupos de jovens que saíram da marginalidade por meio das danças de rua. Como eles mesmos afirmam: “através da dança a gente ‘canaliza’ nossa agressividade e, assim, não precisamos mais ser violentos com ninguém”. Dentro da dinâmica das danças de rua, para se aprender uma coreografia, os participantes devem prestar muita atenção para “pegar os passos” e depois “aprender o estilo”. Como as coreografias são feitas por todos os participantes do grupo e ao longo de vários encontros, faltas não podem acontecer, senão perde-se uma parte das sequências (que são complexas e em um ritmo acelerado) e atrapalha-se o conjunto final. Assim, a disciplina e a responsabilidade são compreendidas, aprendidas e incorporadas no dia a dia desses jovens. Apesar de todos dançarem os mesmos movimentos, há momentos em que um se destaca, realizando sua “improvisação”. É nessa hora que o jovem tem a oportunidade de trabalhar a sua individualidade, mostrando o seu “estilo” pessoal e sua virtuosidade, visto que é no solo que o jovem realiza as acrobacias mais complexas.
Compartilhando experiências – oficinas
Em junho passado, a professora, aproveitando sua visita a Tupã para participar do I Tupã-Dança, ministrou uma oficina “teórico-prática” de atividades corporais artísticas para professores do ensino formal.
Abaixo, segue a descrição da experiência dessa professora:
O curso contou com a participação de professores de educação física, educação artística, línguas, dança e professores de pré-escola. Havia tomado o cuidado de intitulá-la oficina “teórico-prática” (embora não concorde com essa dicotomia teoria/prática, nem com essa expressão que junta separando) com o intuito de deixar claro que haveria uma parte prática e que todos, sem exceção, deveriam participar de todas as atividades propostas.
Alguns poucos professores participantes esperavam receber fórmulas pré-fabricadas ou receitas prontas de como trabalhar a dança no espaço escolar. Tinham a expectativa de aprender alguns “passinhos” (como disseram) ou mesmo algumas coreografias para poderem, mais tarde, transmitir a seus alunos, seja na festa junina, que se aproximava, seja nas comemorações folclóricas do mês de agosto. Normalmente, professores com esse tipo de expectativa costumam ficar apavorados cada vez que chega uma data comemorativa e que se veem “obrigados” a preparar algum evento com as crianças. Eles não acreditam em seus potenciais criativos e preferem copiar fórmulas prontas. No entanto, havia deixado claro que esse não era o objetivo da oficina. Não havia “prato-feito” para “pronta entrega”, em que basta telefonar que a comida chega em casa, sem trabalho algum. Muito pelo contrário, todos teriam de erguer as mangas, pôr a mão na massa e se sujar para “aprender fazendo”. O objetivo da oficina era proporcionar aos professores da rede de ensino a oportunidade de aprenderem a “pensar com o corpo”. E como fazer isso senão por meio do próprio movimento?
As atividades práticas se baseavam em elementos trabalhados em aulas de dança. Em um primeiro momento, focamos o desenvolvimento da consciência corporal utilizando os conceitos oriundos da educação somática. Grosso modo, a educação somática é entendida como atividades em que o corpo é trabalhado de modo a integrar todos os aspectos que o compõem: social, espiritual, psíquico, físico etc. Assim, temos as práticas como as técnicas de Alexander, Feldenkrais, Body-Mind-Centering, Eutonia, Fundamentals®, entre outras. Como representantes da vertente brasileira de educação somática, temos o trabalho de Klauss Vianna e de José Antonio Lima. Em um segundo momento da oficina, trabalhamos a criação coreográfica, por meio da exploração espacial, baseando-nos nos preceitos de Rudolf von Laban (1879-1958). (Não iremos aqui discorrer longamente sobre o trabalho desenvolvido por esse reformador do movimento, visto que outros autores ficaram incumbidos de fazê-lo. No entanto, não podemos deixar de falar sobre ele, pois, quando se pensa em dança-educativa, seu nome é um dos mais citados). Esse coreógrafo austro-húngaro e estudioso do movimento revolucionou a maneira de se pensar o corpo em movimento. Ele desenvolveu um método de análise do movimento, definindo os elementos que o compõem. Elaborou igualmente um método de escrita em dança, a Labanotiation. Seus trabalhos têm diferentes aplicações que vão da educação da dança, da criação coreográfica ao trabalho terapêutico. Seu trabalho foi introduzido no Brasil por Maria Duschenes.
Acreditava-se que nessa oficina seria muito mais salutar ensinar os professores a pensar com o corpo, que ficar discutindo sobre o corpo, como se este fosse um objeto à parte de nós mesmos. Ao mexer com o corpo, ao criar, ao se expressar, esses professores estavam adquirindo informações, sensações que seguramente iriam, mais tarde, nutrir e enriquecer suas análises e discussões teóricas. Acreditava-se que, em uma oficina, deveria oferecer-lhes o que não encontrariam em livros: a oportunidade de tocar e ser tocado, de expressar e ser visto, de falar e ouvir com o corpo todo. As atividades proporcionariam explorações sensoriais. O grupo de participantes, a princípio tímido, foi aos poucos se soltando e, ao final, se entregou completamente ao jogo, explorando o espaço, dançando e cantando.
Gostaria de ressaltar o comentário de uma professora da rede pública aposentada, Gilcélia, que trabalha atualmente no setor privado. Esta tentou escapar de uma das atividades propostas que consistia em ser carregado pelo grupo em duas situações distintas: com o corpo contraído e com o corpo relaxado. Apesar de sua tentativa de fuga, não teve escapatória e foi logo carregada. Quando se esticava no chão, aguardando ser levantada, não parava de exclamar: Vocês não vão conseguir! Vocês não vão me aguentar! Qual não foi o seu espanto (e também do grupo) ao perceber que estava a dois metros do chão, segura por dezenas de mãos que a suspenderam acima do nível de suas cabeças. Ao final do trabalho, emocionada, percebeu o quanto havia sido importante participar do exercício, pois percebera que, na verdade, a imagem que tinha de si própria não correspondia à realidade. Sentiu-se mais leve e feliz. Seguramente, essa sensação lhe ensinou muito mais e foi-lhe muito mais importante que qualquer discussão teórica a respeito dos benefícios do desenvolvimento de um trabalho corporal dentro da escola.
Os professores, ao sentirem no corpo essas descobertas, podem compreender melhor o que se passa nos corpos de seus alunos, crianças ou adolescentes. Ao experimentarem o prazer do movimento e os benefícios que estes trazem, tanto para o físico quanto para o mental, podem ver com outros olhos essas atividades na escola. E o mais importante, ao invés de simplesmente “memorizarem” passos coreográficos, esses professores terminaram a oficina com um instrumental muito maior para realizarem suas próprias criações.
A educação e a fábrica de corpos
A dança na escola deve ultrapassar a ideia de ser voltada apenas à criança e ao adolescente. Após essa experiência com os professores da rede de ensino de Tupã, ficou mais evidente que trabalhar com os professores é importante não apenas para a formação destes (e para o bem-estar dos mesmos, evidentemente), mas também que o corpo do professor funciona como modelo para o aluno.
É inerente ao ser humano sua capacidade de imitação. A criança aprende por meio da reprodução dos gestos dos adultos. Marcel Mauss, sociólogo e antropólogo francês e um dos primeiros a classificar as técnicas do corpo, concluiu que todas as ações humanas, desde a mais simples posição deitada (simples entendido como mínimo esforço físico solicitado) até as ações mais elaboradas, como nadar (que requer um treinamento específico), são técnicas adquiridas por meio da imitação. O adulto faz e a criança copia.
O ensino da dança e das demais artes da tradição oral é feito por meio da observação e reprodução do observado. Na maioria das técnicas sistematizadas e codificadas, o professor faz e o aluno imita. Poderíamos pensar que no caso da dança na escola – onde se trabalha mais a exploração e a criação do próprio aluno que o aprendizado de passos específicos – a imitação não está presente. No entanto essa ideia é equivocada. Alguns estagiários ficavam preocupados com a questão de dar exemplos de movimentação ou de servir de modelo. Porém eles próprios perceberam que, muitas vezes, em suas criações, as crianças reproduziam gestos oriundos de grupos vistos na televisão (“dança da garrafa”, da “bundinha” etc.). Se os estagiários não são e não querem assumir um papel de modelo, a mídia o é em todo momento. Cabe agora a cada um refletir sobre qual modelo considera mais interessante e, sobretudo, trabalhar com as crianças o desenvolvimento do olhar crítico.
Temos que ressaltar que não apenas a movimentação serve de modelo. A própria postura também é objeto de imitação. Lembro-me de um professor de dança que vivia corrigindo a postura de seus alunos e que não sabia mais o que fazer, pois eles acabavam sempre voltando àquela indesejada. Um dia, ele veio me procurar na tentativa de solucionar essa questão. “O que fazer? Que tipo de exercício posso estimular?” – perguntava. Ao vê-lo, minha resposta foi clara e curta: “Corrija você a sua própria postura que os alunos, aos poucos, corrigirão a deles.” Não adianta o professor corrigir insistentemente a postura dos alunos se o que lhes fala mais forte não é a palavra (verbo) e sim o modelo vivo (corpo).
Desenvolver um trabalho corporal com os professores teria uma dupla função: despertá-los para as questões do corpo na escola e possibilitar a descoberta e desenvoltura de seus próprios corpos, lembrando que, independente das disciplinas que lecionam (português, matemática, ciências etc.), seus corpos também educam. É comum percebermos pessoas que adquirem a maneira de gesticular daquele com quem convive cotidianamente. Basta pensarmos nos gestos que “herdamos” de nossos pais ou observarmos velhos casais. Há a tendência de se reproduzir a mesma movimentação de cabeça, adquirir o mesmo “tic” ou assumir a mesma postura. Assim, diante de uma classe de crianças, queiramos ou não, somos sempre um modelo para a imitação pela mimésis. Dessa forma, acredito que os cursos de formação de professores, seja a graduação em Pedagogia ou as demais licenciaturas específicas, deveriam pensar com seriedade no oferecimento de disciplinas de cunho artístico corporal.
Fica claro que a questão da educação corporal não é de responsabilidade exclusiva das aulas de educação física, nem de dança ou de expressão corporal. O corpo está em constante desenvolvimento e aprendizado. Possibilitar ou impedir o movimento da criança e do adolescente na escola; oferecer ou não oportunidades de exploração e criação com o corpo; despertar ou reprimir o interesse pela dança no espaço escolar; servir ou não de modelo, de uma forma ou de outra estamos educando corpos. Nós somos nosso corpo. Toda educação é educação do corpo. A ausência de uma atividade corporal também é uma forma de educação: a educação para o não movimento – educação para a repressão. Em ambas as situações, a educação do corpo está acontecendo. O que diferencia uma atitude da outra é o tipo de indivíduo que estaremos formando. Cabe agora a cada um de nós fazer a reflexão.
A Dança, a criança e a escola
Segundo Godoy (2010), a criança entra em contato com o mundo por meio de suas sensibilidades, que possibilita com que ela se manifeste e se comunique com o mundo em que vive. Esse contato de comunicação se dá pelas diversas formas de linguagem, em que a primeira delas é a linguagem corporal, que, como toda linguagem, é constituída por uma série de códigos simbólicos.
Quando a criança domina esse universo simbólico, ela desenvolve um repertório de movimentos corporais (gestuais), possibilitando expressar suas tristezas, alegrias, angústias e outros tantos sentimentos possíveis de se nomear, mas, além disso, esse desenvolvimento permite expressar o inatingível, ou seja, aquilo que não se nomeia, mas que colabora em nossa expressão.
Como a dança faz parte desse universo expressivo de comunicação, o ambiente escolar se constituiu uma possibilidade de favorecer o contato e a aprendizagem da dança. Uma das possibilidades de trabalhar dança na escola é o desenvolvimento de projetos artísticos educativos. Esses projetos devem ter propostas que prevejam o entrelaçamento entre extensão, pesquisa e ensino por meio do desenvolvimento de ações multidisciplinares.
Laban, no livro Dança Educativa Moderna, introduz seu pensamento afirmando que “na atualidade, é perfeitamente compreensível que a educação escolar deva levar em conta o tema do ensino da dança. A pergunta é: como proceder?”. Assim, Laban, há mais de cinquenta anos, pressupôs que a necessidade do movimento fosse um fator óbvio para a sociedade em que vivia e que se tratava, pois, de se estabelecer certos princípios para o ensino dessa arte. Nota-se que a necessidade de movimentação na nossa sociedade é um pouco diferente da sociedade contemporânea a Laban.
Na verdade, no momento atual, a preocupação é de resgatarmos a importância do corpo e do movimento desse corpo para a saúde e para a qualidade do desenvolvimento humano, para posteriormente introduzirmos a dança na vida social por meio da escola. Ainda não é suficientemente visível essa “perfeita compreensão” de que a dança deva ser realmente levada em conta no ensino escolar. Por esse motivo, Laban foi escolhido como ponto inicial e essencial no desenvolvimento da dança na educação infantil.
Os estudos de Rudolf Laban na Dança Educativa começaram com a pesquisa dos movimentos orgânicos instintivos correspondentes a cada faixa etária do desenvolvimento mental do ser humano. Segundo Laban, antes de adotar qualquer sistema de ensino de dança nas escolas, é conveniente aprender os esforços instintivos da criança para seu desenvolvimento.
O bebê sabe como colocar em movimento seu corpo-máquina, capacidade que é dom natural, comum a todos os seres vivos. Essas ações naturais, embora sejam instintivas, têm uma finalidade evidente, mesmo o bebê não conhecendo essa finalidade. Essa atividade primária do homem é uma preparação ou apenas uma primeira etapa de um sistema de atividades mais complexas. Sua pesquisa mostra que essas atividades de ações naturais focam o desenvolvimento motor e mental da criança.

Laban observou que na criança jovem, por volta dos 4-5 anos, a atividade motora é muito intensa, na maioria das vezes, no corpo todo, priorizando movimentos rápidos, fortes e diretos nas partes inferiores e flexíveis nas partes superiores. Existe uma tendência de abrir o corpo e alongar sua forma arredondada. A criança, porém, ainda não tomou consciência do espaço uma vez que usa esforços diretos. Nessa fase, o professor vai guiar a criança para que ela empregue suas ideias. Ele pode despertar nela a compreensão da relação do movimento com seu redor.
Devido então à riqueza de movimentos na dança moderna é exigido um novo enfoque do ensinamento. Não há como estudar cada movimento em particular, deve-se, sim, buscar compreender e praticar o princípio do movimento. Outra nova ideia para o homem atual onde tudo é único e dissociado e é exigido dele um entendimento específico de mais de milhões de funções, perde-se a noção de unidade universal e de princípios básicos. Aqui também a dança se mostra fundamental a partir do momento em que a “quantidade insuperável de conhecimento intelectual necessário para o domínio da vida moderna necessita de um fator de equilíbrio no qual as faculdades naturais do homem passam a se colocar em prática e achar uma saída”.
A nova técnica procura integrar o conhecimento intelectual à habilidade criativa, um objetivo de suma importância em qualquer forma de educação. Na verdade, o que se procura nas escolas não é a perfeição ou criação de danças sensacionais, mas o efeito benéfico que a atividade criativa da dança tem sobre o aluno.
Comparando as teorias de Piaget que descrevem o desenvolvimento da criança por várias etapas e a de Laban, que divide o ensino da arte do movimento segundo grupos de idade, veremos que ocorrem semelhanças e estas nos mostram uma interessante ligação entre o desenvolvimento cognitivo e a arte do movimento.
Laban, assim como Piaget, observou os avanços da Biologia, no estudo dos organismos vivos e da matemática orgânica em geral, verificando que a manutenção da coesão do tecido vivo é resultado de uma harmonia que se repete, de certa maneira, constantemente, pois a cada instante a integridade do organismo necessita da ação conjunta do todo e de suas partes.
Os bebês realizam movimentos diretos, fortes, bilaterais que em muito se assemelham com golpes e socos no ar. Segundo Piaget, a criança nessa fase (antes do primeiro ano de vida) não possui a noção de objeto permanente. Quando a criança adquire essa noção, os movimentos descritos por Laban mostram mais fluidez e direção. A criança, embora sem a consciência no sentido adulto do termo, combina os esforços em suas ações e consegue caminhar. É também nessa idade que os pequenos começam a separar o espaço egocêntrico do externo e também imitam os adultos (antes o bebê apenas reagia aos estímulos externos). A separação dos espaços externos e egocêntrico revela-nos o início do pensamento (ações internas) e imagens mentais.
A criança, de acordo com Laban, tem a natural tendência de movimentar todas as articulações e mostra-se inquieta quando precisa isolar sua movimentação em uma parte do corpo. Observamos que, conforme seu desenvolvimento mental aumenta, a tendência é que ela reduza seu impulso pelo movimento. Piaget coloca as operações feitas no plano das ações (processo de conhecimento empírico) como fundamentais para que os processos do pensamento obtenham sucesso posteriormente. Na teoria labaniana, também não se descarta a ligação do movimento com os processos mentais e diz ser de suma importância o desenvolvimento e equilíbrio de ambos.

É seguindo esse raciocínio que podemos travar uma relação complementar entre uma e outra proposta. O estudo do movimento labaniano bem como sua proposta de ensino do mesmo nas escolas vêm oferecer continuidade ao impulso posteriormente cessado de movimento dos bebês enquanto que Piaget revela a importância do conhecimento empírico nos métodos de educação. Essa relação fica mais clara se fizermos referência ao texto “Para Onde Vai a Educação?”, de Piaget.
A crítica ao ensino das escolas tradicionais é principalmente o fato do conhecimento ser imposto pelos professores, revelando uma autoridade intelectual e moral que em nada contribuem para o real desenvolvimento cognitivo e moral dos alunos. As relações sociais (alunos e professores) são escassas, consequentemente os processos de desenvolvimento de personalidade e raciocínio estão comprometidos. Como contraponto, Piaget nos mostra os métodos das escolas ativa e a importância de considerarmos os processos de desenvolvimento cognitivo e psicológico. Esse último método mostra-se mais interessado no raciocínio e na consciência moral desperta. Tanto os processos empíricos quanto a relação entre indivíduos são importantes e sólidas no método acima descrito.
A teoria e a proposta de ensino da arte do movimento feitas por Laban muito se parecem com a proposta desse novo método de ensino. A arte do movimento na teoria labaniana sob a perspectiva da educação é acompanhada de livre arbítrio, possibilitando as capacidades e tendências das personalidades dos alunos ainda em formação, assim como as atividades e dinâmicas de grupo para o desenvolver do respeito. Fica clara, nas teorias de Laban e Piaget, a importância das relações sociais nos processos cognitivos. As qualidades do estudo labaniano descritas auxiliam nos processos cognitivos das crianças e do adolescente. Propusemos a introdução dessa visão do movimento no método das escolas ativas pelas suas semelhanças e relação de complementação a fim de uma melhoria do ensino.
Dança e Ensino Fundamental

A correção e o assoreamento formal entram na fase dos 6 aos 10 anos, quando a criança já desenvolveu sua personalidade sem restrições nem inibições e pode entender e apreciar o significado completo daquilo que lhe é solicitado. Antes existia o perigo de perder a espontaneidade infantil por excesso de correção, de permitir a entrada furtiva da falta de naturalidade e de interferir o desenvolvimento natural da personalidade da criança. Nessa fase, a aprendizagem pode-se dar de uma forma mais metódica e começar a dar uma maior consciência para as ações básicas de esforço como golpear, chicotear, flutuar, deslizar, empurrar etc.
A aprendizagem para crianças de 12 anos ou mais se relaciona com o enfoque mental. A partir daí, os padrões de movimentos vão se tornar cada vez mais complexos e vai haver um domínio em grande parte consciente do movimento, permitindo a expressão mais aperfeiçoada do que o indivíduo vive internamente.
A própria criança pode corrigir uma composição de esforços ligeiramente desequilibrada se tem a liberdade necessária, mas o professor pode fazer muito mais para ajudá-la a desenvolver harmonicamente todas as suas faculdades. A aprendizagem da dança requer especial importância à medida que os estudos acadêmicos são mais intensos, com o fim de equilibrar os esforços intelectuais cada vez maiores com esforços ativos, de maneira que a criança se desenvolva em sua totalidade, isto é, física, mental e emocionalmente.
O valor educacional da nova técnica de dança deve-se à universalidade das formas de movimento que são ativadas no corpo do aluno. Diferente das outras técnicas, a dança moderna não se utiliza de passos, e sim do fluxo do movimento que se estende por todas as articulações do corpo, fato cada vez mais essencial na sociedade atual, em que a estagnação corporal impera.
Assim, devemos nos concentrar durante os anos escolares em transmitir à criança a apreciação do movimento. A aprendizagem da nova dança anima o desenvolvimento de uma nova consciência clara e precisa dos diferentes esforços do movimento, garantindo assim a apreciação e o gozo de qualquer um dos movimentos de ação, inclusive os mais simples.
A dança traz isto: um sentimento, uma sensação de integração ao mundo assim que se toma a consciência de um corpo não instrumento, um corpo que essencialmente é você, um corpo que simplesmente é: a sensação de que somos no corpo e o corpo é no espaço. Estamos envolvidos pela arte do movimento. Ele está presente em nossas vidas como a água, dentro de nós como nossos fluidos, fora de nós, suprindo-nos e mantendo nossas vidas. Dentro, fora em todo o lugar.
Dança e Ensino Médio

Adolescência por seu termo é um fato sociopsicológico, não necessariamente universal, e que não adota necessariamente em todas as culturas o padrão de características adotado na nossa, na qual, além disso, deu origem a uma importante variação histórica, que, ao longo de nosso século, foi configurada a adolescência que nós conhecemos. A adolescência é a etapa de transição, na qual não se é mais criança, mas ainda não se tem o status de adulto.
Segundo Piaget, a adolescência marca o acesso ao pensamento formal, um novo estilo de pensamento, que se caracteriza por estender, ao domínio das ideias, princípios e proposições abstratas, a lógica que a criança já tinha desenvolvido para dar razão aos fatos e acontecimentos concretos e observáveis.
Segundo Erick Erikson, a adolescência é o quinto estágio evolutivo (dos oito que cita). É o estágio da identidade X, confusão de papéis, em que ocorre grande número de mudanças físicas, a reavaliação de si mesmo e de como são vistos, como unir os papéis e as habilidades com os ideais vocacionais da sociedade. A identidade é a confiança de que o sentimento interior de estabilidade é suportado pela semelhança de nosso significado para os outros. A procura de ajuda na escolha da carreira e outros anseios leva o adolescente à formação de grupos. A confusão de papéis na criança e a sensação de não ser compreendido pelos outros faz com que evite pensar no futuro, sente-se sozinho e inseguro e evita tomar decisões.
A identidade surge como necessidade de considerar o futuro além de lidar com o presente, considerando as ramificações da plena independência como obter uma profissão, um emprego, casar, ter e criar filhos. A famosa crise de identidade da adolescência é o teste que o jovem faz do autoconceito, anteriormente desenvolvido contra as demandas da adolescência, e deve fazer face às futuras demandas da vida adulta. Muitas questões da identidade não são resolvidas antes do final da adolescência.
A dança praticada na adolescência pode ajudar o adolescente com a busca da identidade, um raciocínio corporal das situações vividas. Se o adolescente conhece seu corpo, ele consegue, com maiores chances, expressar sua identidade e não reprimi-la, pois não se encontra ainda preso aos moldes restritos da vida adulta, podendo trabalhar em cima de suas fragilidades mais facilmente.
Se a dança for aplicada às crianças desde a infância, quando adolescentes, estes terão a chance de ter uma melhor iniciativa de expressão, estando mais bem preparados para a entrada na adolescência. É reduzida a possibilidade de inibição da própria personalidade, mesmo com o salto qualitativo e a descontinuidade em relação ao nível anterior cognitivo que Piaget sugere para a fase da adolescência, esta continua sendo um produto da história evolutiva anterior, não ocorrendo uma ruptura com o passado. Isso indica a importância do ensino da expressão corporal desde a infância, que então contribuirá à formação de um adolescente que está mais preparado para os ajustes na entrada dessa etapa de sua vida.
Temas de movimentos avançados segundo Laban
Os temas básicos de movimento são ligados à consciência corporal, às ações de esforço, às relações com o espaço e ao relacionamento social. Devem ser aplicados aos alunos com idade a partir dos 11-12 anos:
- Temas relacionados com as formas de movimento.
- Temas relacionados com as combinações.
- Temas relacionados com a orientação no espaço.
- Temas relacionados com as figuras.
- Temas relacionados com a elevação do solo.
- Temas relacionados com o despertar da sensação de grupo.
- Temas relacionados com as formações grupais.
- Temas relacionados com as qualidades expressivas ou modos dos movimentos.
Os exercícios dos temas avançados do movimento ajudam o adolescente a conhecer melhor o seu corpo e as mudanças que nele foram ocorrendo ao longo do tempo.
O professor deve reconhecer que o movimento pode ser o meio através do qual o aluno pode participar de um ritmo universal, encontrando um tipo de técnica, de ambiente, de estímulo que conduzirá a esse tipo de experiência.
Os temas grupais levam o adolescente a ter noção de grupo e seu funcionamento. O trabalho em grupo leva a uma cooperação mútua e organização, aceitação do próximo e suas qualidades de movimento, bem como o trabalho com qualidades de movimento diferentes e como lidar com essas diferenças. Esses trabalhos em grupo no âmbito de expressão corporal ajudam muito com a tendência ao agrupamento típico da adolescência, pois induz o adolescente a trabalhar com outros corpos bem como seu próprio corpo, inserido no contexto do grupo, e como o grupo influencia esse corpo e sua qualidade de movimento.
Temas relacionados com as matérias escolares podem ser trabalhados como vivências corporais, desde temas históricos até geométricos, e também como se comunicar em um grupo somente com movimentação, sem o uso de palavras.
Os temas de esforço, espaço e direções devem ser trabalhados com o grupo considerando cada indivíduo e ao mesmo tempo o grupo inteiro. A aplicação de temas sem o uso verbal faz com que os alunos decodifiquem as ações básicas do movimento expressivamente, em que um tipo determinado de situação requer uma qualidade de movimento específica. Os estudos dessa movimentação enfocam certa expressão dramática relacionada com a história e com as emoções que irão despertar os diferentes acontecimentos.
Código Elementos morfológicos
O corpo humano é entendido como totalidade (mente e físico), ativado e capacitado para explorar suas possibilidades de movimento e assim desenvolver-se como inteligência múltipla. Tempo coreográfico, espaço coreográfico e qualidade do movimento – seus componentes espaciais (direções, planos, dimensão, caminho realizado), seus componentes temporais (velocidade, duração, acentuação e periodicidade de incidência desses fatores) e os componentes de sua intensidade (peso, esforço, fluxo e impulso).
Estruturas sintáticas
Organização do movimento a partir da priorização de um dos seus elementos, como desenho simétrico/assimétrico; velocidade rápida/moderada/lenta; fluxo solto/conduzido, contínuo/descontínuo; assim como impulso central/periférico. Organização do movimento a partir da combinação desses elementos, resultando em ações básicas como empurrar, socar, torcer, deslizar etc. Organização em grupos funcionais de movimento: gestos, formas de andar, corridas, saltos, giros, quedas e recuperação. Composição a partir de células, repetições, variações, blocos, cânones, simetrias, assimetrias, polirritmia. Criação a partir de diversos estímulos: materiais, imaginários, emocionais, factuais, individualmente ou em grupo.
Tradicionalmente, o tempo, o espaço, a forma e o movimento sempre foram considerados elementos da dança. É importante lembrar que a forma é, de fato, o resultado da composição dos aspectos espaciais, temporais e de intensidade do movimento, não constituindo, portanto, propriamente um elemento. Isso não significa dizer que não se possa ou mesmo se deva pensar, organizar, criar o movimento em função de sua forma. Essa seria mais uma possibilidade de organização e estudo do movimento, incluída nas possibilidades citadas anteriormente.
A organização dos elementos da dança compõe a estética da obra e essa organização variou ao longo da história, por vezes caracterizando escolas, por vezes desconstruindo essas caracterizações. Dessa forma, o estudo de seus elementos é um instrumento eficaz tanto para a experimentação do fazer criativo na dança quanto para a análise dos estilos e das manifestações culturais dessa linguagem. Na organização espaço-temporal da dança, o ser humano revela sua relação com o mundo: a dança constitui, então, além de um instrumento para o autoconhecimento, um instrumento para o conhecimento do outro em seu espaço, para a compreensão vivencial da natureza (aqui incluída a natureza cultural humana), e, consequentemente, para a compreensão da própria sociedade.
A abordagem artística dos movimentos corporais propiciada pela dança, baseada na expressão da experiência vivencial do mundo pelo indivíduo, é uma faceta específica do conhecimento do próprio mundo. Não basta “saber” o mundo e viver nele para conhecê-lo; é preciso sentir e perceber como se relacionar com ele, como imaginar essa relação, traduzindo tudo isso em uma criação expressiva. O conhecimento do mundo passa, pois, pela vivência corporal dos seus elementos, nos aspectos físico-objetivos, sensoriais, pré-simbólicos e simbólicos. Daí a importância do estudo corporal-criativo do tempo, de espaço, da intensidade do movimento e da forma deles resultante na educação escolar. Exemplificando: não basta saber sobre o espaço (estudado em Geografia, Física, História, ainda que de forma interdisciplinar), é preciso vivenciá-lo corporalmente, sentir como nos relacionamos com ele, como podemos organizá-lo, reorganizá-lo, transformá-lo por meio do sensível, por meio de uma consciência estética.
Canal
O corpo humano, em sua aparição fenomenológica. O corpo humano virtualizado, digitalizado pelas diversas mídias contemporâneas: televisão, vídeo, cinema, computador. A aparição presencial do dançarino é, ainda hoje, em tempos de virtualização intensa – e talvez por isso mesmo –, um aspecto importante dessa linguagem artística, além de fundamental na função educativa da dança, tanto do ponto de vista do aluno-espectador quanto do aluno-criador. É no instante do “aqui e agora” que trocas sensoriais, estéticas e éticas se dão entre espectador e dançarino. O corpo humano virtualizado, no entanto, é um importante canal de experimentação e pesquisa da dança atual e deve estar presente na educação escolar, principalmente no Ensino Médio, quando os alunos deparam-se mais intensamente com as mídias citadas anteriormente. Esse “dançar mediado” traz especificidades resultantes do diálogo da dança com as demais linguagens, entendendo aqui como linguagem também as novas tecnologias.
Contexto
Texto da obra
Identificar o contexto em que as obras coreográficas são criadas é fundamental para ampliar a compreensão das relações existentes entre esse contexto e a organização dos movimentos na obra. Toda composição traz marcas do seu criador, do seu tempo, dos seus condicionantes. O exercício dessa contextualização, além de dar acesso ao conhecimento da história da dança, sua origem, seus determinantes socioculturais e sua evolução, instrumentaliza o aluno para a compreensão do seu próprio fazer na dança.
Aluno, professor, escola e comunidade
Dançar não é só uma forma de expressão particularmente importante para os jovens, mas também para os adultos, que têm nela uma oportunidade de se reconhecerem culturalmente e socialmente. É preciso então trazer para o aprendizado da Dança a diversidade que hoje marca esse dançar, fazendo dialogar o legado das danças populares tradicionais e os festejos, as práticas contemporâneas, o pagode, o funk e outras danças da “moda”, com a expressão artística erudita, e esse diálogo deve ser pautado pelas características contextuais da escola e da comunidade na qual esta está inserida, considerando-se todos os seus agentes: alunos, família, professores, funcionários, artistas locais e outros, abrindo espaço na escola para a experiência da oralidade, do saber não formal, das tradições e dos movimentos que dão identidade a essa mesma comunidade.
Ensino Médio
Dar acesso ao conhecimento da diversidade da produção coreográfica, das diferentes formas de organização do código estético-motor praticado por diferentes culturas e estratos sociais é objetivo fundamental do estudo da Dança. No entanto não se deve privar o aluno adolescente ou adulto das importantes descobertas que o processo criativo em dança propicia para aquele que o pratica, descobertas essas que não se extinguem com as primeiras experiências, mas constituem novos desafios e desejos expressivos a cada nova fase da vida humana. Processo e produto estão em permanente transformação, pois assim está o ser humano, modificando-se a partir de si, do outro, das influências sociais, culturais, científicas e, principalmente, a partir do próprio processo criativo.

Quando temos a dança e a educação com significação de um binômio, ambas delimitam um campo híbrido. Nesse sentido, híbrido NÃO significa:
- Mistura de duas espécies diferentes. O certo é: Dissociação.
- Fusão. O certo é: Dissociação.
- Combinação de cultura diversa. O certo é: Dissociação.
- Conexão. O certo é: Dissociação.
- Dissociação. A dança e a educação entendidas como um binômio - seja ele construído por uma conjunção, uma barra, um hífen ou por uma aglutinação - delimitam um campo híbrido. No sentido híbrido, dança e educação estão ligados, mas sem a necessidade de se misturarem ou se fundirem. Ao contrário, quando entendidas enquanto área de conhecimento e atuação profissional, se fundem dialogicamente em justaposição.
Paulo Freire aponta que há duas maneiras do indivíduo estar/ser no mundo: pelos contatos e pelas relações. Diante dessa colocação, é CORRETO afirmar que:
- As relações são intemporais. O certo é: Na área da educação, espera-se que as relações sejam predominantemente estabelecidas.
- Os contatos são reflexivos. O certo é: Na área da educação, espera-se que as relações sejam predominantemente estabelecidas.
- Na área da educação, espera-se que as relações sejam predominantemente estabelecidas. Pois, segundo Paulo freire, contatos são reflexos unívocos, inconsequentes, intranscendentes, estáticos, monológicos e intemporais. Enquanto relações são reflexivas, plurais, consequentes, transcendentes, dialógicas, transformadoras e temporais. Logo, espera-se que haja mais relações do que contatos no âmbito da educação.
- Os contatos tornam as práticas docentes mais humanas e reflexivas. O certo é: Na área da educação, espera-se que as relações sejam predominantemente estabelecidas.
- As relações estabelecem passividade na área pedagógica. O certo é: Na área da educação, espera-se que as relações sejam predominantemente estabelecidas.
Quais são os três tipos de saber no campo das artes?
- O conhecimento direto/o conhecimento sobre artes/o conhecimento de como fazer algo. Pois Marques (2003) aponta que a construção de conhecimento no campo das artes implica três tipos de saber diferenciados e, ao mesmo tempo, complementares: o conhecimento direto, sem intermediação das palavras; o conhecimento sobre as artes; o conhecimento de como fazer algo. Traduzindo esses sentimentos para a área da dança, estes equivaleriam a experimentar (conhecimento direto), sentir (conhecimento sobre), fazer (conhecimento como) dança.
- A relação/o contato/a correlação. O certo é: o conhecimento direto/o conhecimento sobre artes/o conhecimento de como fazer algo.
- A expressividade/o conhecimento/a prática. O certo é: o conhecimento direto/o conhecimento sobre artes/o conhecimento de como fazer algo.
- A somatização/o conceito/a avaliação. O certo é: o conhecimento direto/o conhecimento sobre artes/o conhecimento de como fazer algo.
Conhecimento direto em artes significa:
- Expressividade. O certo é: vivência prática.
- Potencialização. O certo é: vivência prática.
- Vivência prática. Pois o conhecimento direto da dança (a vivência prática) permite um tipo diferenciado de percepção, discriminação e crítica, tanto da dança quanto de suas relações conosco mesmo e com o mundo (MARQUES, 1989 apud 2003, p. 23).
- Imaginação. O certo é: vivência prática.
- Pesquisa teórica. O certo é: vivência prática.
A professora Adriana aplicou em sua turma de dança uma aula de livre criação em dança, com transferência de peso, segundo Klauss Vianna, para indivíduos acima de 60 anos, que abordasse os bailes da década de 50. Considerando esse exemplo, assinale a alternativa que corresponde ao texto, ao subtexto coreológico e ao contexto consequentemente.
- Transferência de peso/Aula de livre criação/Baile dos anos 50. O certo é: Aula de livre criação/Transferência de peso Klauss Vianna/Bailes da década de 50.
- Bailes da década de 50/Transferência de peso Klauss Vianna/Aula de livre criação. O certo é: Aula de livre criação/Transferência de peso Klauss Vianna/Bailes da década de 50.
- Transferência de peso/Bailes da década de 50/Aula de livre criação. O certo é: Aula de livre criação/Transferência de peso Klauss Vianna/Bailes da década de 50.
- Aula de livre criação/Bailes da década de 50/Transferência de peso Klauss Vianna. O certo é: Aula de livre criação/Transferência de peso Klauss Vianna/Bailes da década de 50.
- Aula de livre criação/Transferência de peso Klauss Vianna/Bailes da década de 50. Pois texto corresponde ao repertório dançado; subtextos são os aspectos coreológicos, o movimento e suas estruturas; enquanto o contexto corresponde aos elementos históricos, culturais e sociais.